O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o paraense Ophir Cavalcante Júnior, afirmou ontem que a campanha agora movida contra ele pelo presidente deposto da OAB estadual, Jarbas Vasconcelos, e seus aliados, Eduardo Imbiriba de Castro e João Batista Vieira dos Anjos, o “João Índio” - que na sexta-feira passada ingressaram na 1ª Vara da Fazenda de Belém com ação popular, acusando-o de receber, há 13 anos, R$ 20 mil por mês como procurador licenciado do Estado, o que seria ilegal - é o desdobramento de “ameaças feitas contra mim para que agisse nos bastidores do Conselho Federal e tentasse impedir a intervenção na seccional”.
Em entrevista exclusiva ao DIÁRIO, Cavalcante voltou a negar que a remuneração mensal que recebe do Estado seja ilegal, acrescentando que a Procuradoria do Estado, para aprovar e depois prorrogar a licença remunerada, teria agido dentro da legalidade. Ele revela que Vasconcelos chegou a lhe dizer que se ocorresse a intervenção na OAB paraense, a “mortalha” não cairia somente sobre a cabeça dele.
Não aceitei as ameaças, partidas do próprio Jarbas, porque a Ordem não pode ter dois discursos, um para dentro e outro para fora da entidade”, disse Cavalcante. E lembrou que Eduardo Imbiriba, um dos que assinaram a ação contra ele, tentou impedir, na Justiça, em Brasília, que houvesse a sessão do Pleno do Conselho Federal que decidiu pela intervenção na seccional. Segundo Cavalcante, se o Conselho Federal tivesse rejeitado o pedido de intervenção e mantido Vasconcelos à frente da OAB estadual, não haveria nenhum processo contra ele. “Por que não fizeram isso antes da intervenção?”, questiona, enfatizando que o processo é apenas “retaliação”.
P: O que o senhor tem a dizer sobre a ação popular proposta por dois advogados, acusando-o de receber suposta remuneração ilegal do Estado?
R: Que isso é uma retaliação em razão da atitude por mim tomada de não interferir na decisão tomada pelo Conselho Federal de fazer a intervenção na OAB do Pará. Durante o período em que me afastei desse caso (impedimento motivado pelo regulamento geral da OAB em virtude da origem do presidente ser a mesma da entidade cuja diretoria era investigada por participação na venda de um terreno da OAB de Altamira, além de fraude na assinatura do vice-presidente da seccional) recebi várias ameaças. Elas diziam que se viesse a acontecer a intervenção ou qualquer medida disciplinar contra o presidente afastado, isso teria uma repercussão pessoal para mim. Essa repercussão seria a licença remunerada que eu recebo da Procuradoria Geral do Estado.
P: O senhor identificou de onde partiam as ameaças?
R- Sim, elas foram identificadas. Eram recados mandados pelo próprio presidente Jarbas Vasconcelos. Ele queria que eu usasse meu poder de presidente do Conselho Federal para impedir que o processo de intervenção fosse apreciado pelo Pleno do Conselho Federal. Eu estava submetido a uma vedação legal e não podia me manifestar sobre o processo de intervenção ou sobre qualquer outro processo da seccional paraense.
P: Então, o Jarbas Vasconcelos queria que o senhor agisse por debaixo dos panos para que não houvesse a intervenção?
R: Exatamente. O objetivo era esse. Houve uma pressão a nível nacional nesse sentido, através de várias pessoas, inclusive de partidos políticos ligados ao Jarbas, como o PT. Não quero dizer que era o PT como partido, mas algumas pessoas a ele filiadas, parlamentares do Pará, que fizeram contatos com os conselheiros. Acontece que a Ordem não é submetida a nenhum partido. Isso não deixou de ser uma agressão à nossa entidade. O objetivo era que a Ordem jogasse todas as acusações para debaixo do tapete, como se ela tivesse dois discursos, um para fora e outro para dentro da entidade. Jamais eu iria concordar com isso. Primeiro, porque estava impedido de me manifestar no processo, como de fato não me manifestei. Segundo, porque a Ordem não iria se calar, como nunca se calou, em circunstâncias como esta.
P: Afinal, a remuneração que o senhor recebe do Estado é ou não ilegal? Os advogados que entraram na Justiça afirmam que sim.
R: A licença foi autorizada pela Procuradoria Geral do Estado, pelo Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado, isso em diversos governos, inclusive durante o governo anterior (Ana Júlia Carepa, do PT). O procurador-geral do Estado (Ibrahim Rocha), também assinou a prorrogação da licença remunerada. Essa licença remunerada é baseada no artigo 95, da lei 5.810/94, que trata do regime jurídico único dos servidores do Estado. Essa licença assegura a remuneração ao servidor em desempenho de mandato em associação de classe no âmbito nacional.
P: Mas, na ação, os advogados alegam que a OAB não seria uma entidade classista e que, portanto, a licença remunerada seria contrária à legislação.
R: A lei fala em associação de classe de âmbito nacional. Ora, além das funções institucionais que a Ordem exerce, ela é uma entidade de classe. Isso é óbvio. E todos estão de prova, inclusive o povo do Pará, da minha dedicação em favor da advocacia e da cidadania neste país no exercício do meu mandato na OAB. Não há qualquer tipo de ilegalidade nessa remuneração. Aliás, essa matéria foi apreciada internamente dentro da Procuradoria Geral do Estado. Foram também feitas análises do processo a cada renovação, quando houve necessidade, e publicado no Diário Oficial.
P: Isso, porém, agora explodiu com força na mídia nacional.
R: Veja bem. Isso está vindo à baila nesse momento. E por que não veio antes? Exatamente porque se trata de uma retaliação devido à postura que tive de não transigir com nenhum tipo de improbidade que fosse praticada dentro da Ordem. Caso não tivesse havido a intervenção na OAB, certamente essa ação não teria sido ajuizada contra mim. O Jarbas me disse pessoalmente que essa mortalha não cairia somente sobre ele. No caso do advogado Eduardo Imbiriba, que assina a ação, ele ingressou na Justiça para tentar impedir a sessão do Conselho Federal que julgou o pedido de intervenção.
P: Caso a ação popular seja acolhida pela Justiça, a Procuradoria Geral do Estado estará em apuros, porque foi ela quem concedeu a licença. Os procuradores que assinaram a ação também poderiam ser processados.
R: Vou repetir: a licença é legal e não há qualquer novidade no Direito brasileiro com relação a isso. Todas as licenças foram publicadas no Diário Oficial do Estado e jamais foram contestadas por quem quer que seja. Agora é contestada com espírito de vingança por pessoas que não conseguem perceber a dimensão do trabalho que a Ordem desenvolve no Brasil. Lamento que isso esteja ocorrendo, mas a gente deve ter serenidade para administrar essas coisas.
P: O que o senhor diria para a sociedade paraense que tem acompanhado seu trabalho?
R: Que tenho procurado honrar meu mandato, defendendo bandeiras que são da cidadania brasileira. E vou continuar a fazer isso. Não será esse tipo de medida que irá calar a Ordem, nem seu presidente. Quero tranquilizar a sociedade paraense e afirmar que a retaliação contra mim será combatida no âmbito processual. A licença remunerada é perfeitamente legal e eu confio na Justiça do Pará, que vai declarar isso ao final do processo.
(Diário do Pará)