Num julgamento em que, ao final, houve bate-boca entre os desembargadores Leonam da Cruz Junior e Mairton Carneiro - Leonam chegou a "exigir respeito" de Mairton -, a Terceira Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Pará, por 2 votos a 1 decidiu tornar nulo todo o processo no qual o ex-deputado Luiz Sefer foi condenado a 21 anos de prisão por estupro de uma menina de 9 anos. Os votos de Mairton e da desembargadora Maria Edwiges Lobato deram a vitória a Sefer, enquanto Leonam votou contra o recurso da defesa.
A revisão da pena de 21 anos e a multa de R$ 120 mil, que estavam na pauta, sequer foram julgadas. No começo da sessão desta manhã, o desembargador Mairton Carneiro informou que havia um "incidente processual", no caso um agravo regimental transformado em agravo interno, provocado pelo advogado Roberto Lauria, defensor de Sefer. O agravo tinha preferência sobre os outros dois temas, porque determinaria o rumo do caso. E que agravo era esse?
Segundo recurso de Lauria, todo o inquérito policial instaurado para apurar o caso de estupro contra a menina seria nulo, porque a autorização para a abertura de tal inquérito teria de ser dada pelo Tribunal de Justiça do Estado em razão de Sefer ostentar na ocasião o foro privilegiado por sua condição de deputado estadual.
A procuradora do MP, Ubiragilda Pimentel, usou da palavra e repeliu a tese da defesa, lembrando que já havia se passado oito anos da condenação e só agora o advogado de Sefer estava atravessando uma petição querendo tornar nulo o inquérito policial. Ela lembrou que "acertadamente" o desembargador Raimundo Holanda havia indeferido a pretensão do advogado, considerando-a "extemporânea e incabível" a autorização do Tribunal de Justiça para a lavratura do inquérito policial contra Sefer. "Foro privilegiado é para julgamento e não para a fase de investigação", afirmou a promotora.
Roberto Lauria, ao defender sua tese, que ele chamou de "inédita", inicialmente reconheceu que oito anos atrás ainda não atuava na causa do ex-deputado. Portanto, não poderia tê-la arguido, o que o fazia agora por entender que o recurso "é matéria de ordem pública". Disse que não estava preocupado se sua petição seria ou não desentranhada dos autos.
"O pedido guarda harmonia com a decisão do STJ", argumentou o advogado, acrescentando que a petição poderia " ser julgada até de ofício". E mais: sua tese, repetiu, por ser "inédita", não de mérito, mas de ordem pública, obrigava o Tribunal a lhe dar uma resposta. No final de sua oratória, Lauria ressaltou que o próprio desembargador Mairton Carneiro já havia "detectado uma prescrição nos autos", acolhendo a tese de nulidade do inquérito policial por não ter autorização do TJ.
Não deu outra. Mairton Carneiro começou sua explanação indo direto no assunto, ou seja, derrubando o inquérito policial. Disse que defendia a nulidade absoluta do processo. Num longo voto, dando razão ao advogado do ex-deputado, o desembargador, sempre seguindo o entendimento de que o processo não tinha qualquer validade, afirmou que tudo deveria "voltar ao juiz natural". Disse que a falta de autorização do TJ "contaminou todo o inquérito".
Quer dizer, a denúncia do Ministério Público também de nada valia. Houve "usurpação de competência" do TJ, que segundo o desembargador deveria ter autorizado o inquérito. Em vista disso, todas as provas contra Sefer seriam nulas. "O presente recurso de agravo regimental, em sede de agravo interno, merece ser acolhido", resumiu Carneiro. Votou para que o processo volte ao juízo de origem para que tudo comece do zero.
O revisor do caso, Leonam da Cruz Junior, discordou de Carneiro, afirmando não ter visto no recurso qualquer prejuízo à defesa de Sefer na coleta de provas. Lembrou, a respeito disso, voto da ministra do STF, Carmem Lúcia. "Vejo o pedido de nulidade como natimorto", disse Leonam. Segundo ele, discordando de Carneiro, o Código Penal, que é de 1941, não mudou até hoje, quando fala sobre a instauração do inquérito policial.
Para Leonam, não se pode acatar a nulidade de toda a investigação, porque não há como sustentar argumentação nesse sentido. "Não pelo decurso do tempo, porque não encontro respaldo legal. Conheço do agravo interno em que foi transformado o agravo regimental, mas não lhe dou provimento". Por fim, disse que não é necessário a autorização do tribunal para colher depoimentos.
Sem justificar ou apresentar qualquer argumentação em seu voto , a desembargadora Maria Edwiges Lobato concordou integralmente com as argumentações do relator, Mairton Carneiro, que já havia incorporado a tese apresentada pelo advogado Roberto Lauria, votando pela nulidade absoluta de todas as provas colhidas no inquérito policial e, por conseguinte, do processo que redundou na condenação a 21 anos de prisão em regime fechado de Luiz Sefer.
Ubiragilda Pimentel, anunciou que irá recorrer contra a decisão da Terceira Turma Penal, que por 2 votos a 1 aceitou os argumentos da defesa.